Feminismos (ou uma homenagem para minha mãe!)
março/2014

Vou arriscar  falar sobre o meu feminismo (a quem interessar possa).  É um tema que hoje acho delicado. Eu acho delicado pra mim porque me falta compreensão. Outro dia brinquei que sinto que estou velha quando tenho que decifrar mensagens de pessoas mais jovens. maeAlguns jargões já fogem ao meu entendimento.

Então, por não encontrar respostas, formulei  meus próprios ideias feministas que em muitos pontos se solidariza com as feministas do mundo todo, em outros nem tanto. Mas sempre o que todas as feministas desejam: mulheres livres lutando pela felicidade ombro a ombro com os homens.

Em uma entrevista não lembro para qual programa, Regina Navarro perguntada sobre se era feminista, respondeu que todo mundo tem que ser feminista por que basta olhar todo o sofrimento da mulher ao longo da história para ser feminista. Fechei com ela!

Então eu sou feminista porque reconheço e respeito a dor e a luta de todas as mulheres ao longo da história. Reconheço que a vida que temos hoje é muito diferente da vida das nossas mães e das nossas avós. Não temos ainda a vida livre que desejamos  mas não paramos ainda de caminhar.

Eu já contei mil vezes essa história mas vou contar de novo porque ela é a pedra fundamental da minha construção íntima, a mulher que eu sou veio de muitas lições de vida. Essa é uma delas…

Minha mãe nasceu em uma pequena aldeia de Portugal e era uma sinhazinha. Como era de costume que as moças fossem prendadas aprendeu a cozinhar, lavar e costurar. Pronta para casar, escolheu um pretendente que não agradou minha avó que a mandou para o Brasil a fim de esquecê-lo.

E aconteceu que ela aqui se casou por amor com meu pai, um seu patrício de “trás-os-montes”. Foi tudo um sonho mas  quando acordou tinha quatro filhos pra criar e estava sozinha. Foi um casamento de opressão. Ela quase chegou a perder os dentes porque meu pai jurava que ela tinha um caso com o dentista. E ele também bebia e não ajudava nem com a casa nem com os filhos.

Uma história comum como tantas outras. Mas  aqui é a parte que me encanta: um dia ela se lembrou que sabia costurar e a máquina de costura foi sua arma para criar os filhos com a dignidade que também trouxe na bagagem.

Lutou muito. Passava dias em cima da máquina de costura com os filhos chorando na barra da sua saia. Também deu pensão, cozinhou pra fora…

Eu acho lindo porque ela transformou um instrumento de opressão em uma arma de luta pela liberdade. Afinal ela aprendeu a costurar apenas para remendar as cuecas do meu pai!!

E foi essa mulher que eu cresci admirando e que sem saber  me deu as primeiras noções de feminismo.

Eu comecei a trabalhar muito cedo e tive filho cedo também. E como minha mãe criei meu filho sozinha.

Há 30 anos não era muito fácil  vencer no mercado de trabalho quando você é a única pessoa da equipe que precisa sair correndo para atender seu filho que está com febre. Ou mesmo vencer os espaços antes dominados pelos homens sem chorar por causa das cólicas. Aprendi cedo a engolir o choro.

Carrego essa herança de ringue mesmo. Eu era a mulher desses cartazes que circulam por ai no dia das mulheres. Em cima do salto alto pra me dar ao respeito. É. “Dar-se ao respeito” era fazer o outro nos respeitar.  E era realmente importante.

Eu nunca me furtei a usar de um pouco de sedução no ambiente de trabalho. Era o respeito que eu impunha que me protegia. E me protegia também o fato de não ter medo de falatórios.  Eu realmente não me importava. Eu fazia um bom trabalho e brigava por salário. Homem a homem.

Não escapei dos revezes. Tive sim que parar de trabalhar por um tempo quando meu filho teve problemas na escola.  Também não escapei de viver várias situações de abuso, algumas tão amargas que ainda hoje estão para ser digeridas.

Tive momentos de muita angustia. De muita solidão também. Alguns anos  atrás eu estava a um passo da depressão, e minha mãe me disse: “Filha, você viu quanto eu sofri. Agora eu não tô aqui? Vocês todos não estão criados e bem? A vida é assim. Não chore. Lute!”  Essa força que eu quis trazer para o blog. Porque a gente não tem que ficar com mimimi, sabe? Nós sabemos o que precisamos fazer. E sabemos como fazer.

Quando eu estava perto de ter meu filho eu pensava que não ia saber como cuidar dele. E se eu deixasse ele cair? E se eu não gostasse dele? E se eu não fosse uma boa mãe? Nossa, eu tinha tanto medo… Mas quando ele nasceu, que eu o peguei no colo pela primeira vez, eu não tive medo. Não seria perfeita mas saberia o que fazer em cada momento.

Não havia nenhum movimento feminista forte. Já existia, é claro. Eu é que não me tocava. Eu de verdade nunca vi as coisas como fardo do feminino. Eu via como vida mesmo. Resultado das minhas escolhas.

Por isso no meu feminismo não cabem muito essas discussões sobre se é rosa ou azul,  se tem que ter pelo ou não tem que ter pelo, se a Barbie pode ter influenciado uma geração, se vamos de minissaia ou de burca. São relevantes para vários movimentos e aí é que me cansa um pouco porque acho fora de foco.

Eu me interesso pelas discussões que dizem respeito as liberdades individuais como é a questão da descriminalização do aborto. Como posso me tornar responsável pelo que acontece comigo se não puder fazer minhas próprias escolhas? Quando terei o controle sobre minha vida se tudo é sina?

Também eu gostaria de ver mais campanhas sobre violência na TV, nos cartazes. Não só quando chega o dia das mulheres mas sempre.  Temos leis que punem agressores mas não está funcionando. Todos os dias uma mulher é morta porque tentou abandonar o parceiro. Todos os dias milhões de mulheres são vítimas de violência e/ou abuso. E esse quadro não está mudando.

É preciso um freio definitivo nisso. Uma ação conjunta que faça o sujeito lá no meio do mundo entender que não pode ser violento. Um esforço de toda a sociedade. Não só das mulheres, mas dos homens. Que conversem com seus amigos. Que se abra amplo debate sobre essa questão.

Enfim, esse é o meu feminismo.

Feliz Dia Internacional da Mulher.